Capitólio
Notas de Programa por Fernando Miguel Jaloto
As sonatas para viola da gamba e cravo, BWV 1027–1029, são três sonatas compostas por Johann Sebastian Bach para viola da gamba e cravo, provavelmente no final da década de 1730 e início da década de 1740. São obras de uma beleza única, que se manifesta não só no requinte da sua composição, nomeadamente na maneira como combinam a escrita concertante com a forma da sonata barroca, mas também no virtuosismo que exigem dos seus interpretes. A datação destas três obras de Bach e algo problemática, não só porque apenas subsiste uma partitura autografa da primeira sonata, como e do consenso geral que todas elas são o resultado de transcrições e adaptações feitas pelo compositor a partir de obras anteriores, destinadas a diferentes combinações instrumentais. As obras tais como as conhecemos hoje parecem estar associadas ao período entre 1729 e 1737, em que Bach dirigiu o Collegium Musicum de Leipzig, uma orquestra semiprofissional e ≪sociedade de concertos≫ fundada por G.Ph. Telemann, que realizava concertos semanais no Cafe Zimmermann, e para a qual o compositor escreveu ou reviu uma grande quantidade de música instrumental. Assim, para exemplificar a história conturbada destas obras, basta recordar que das primeiras sonatas subsistem duas outras versões: um trio para duas flautas e baixo continuo (BWV 1039) e uma versão, provavelmente apócrifa, para órgão solo, sendo que o original devera ter sido um trio para dois violinos e continuo. Pertencem ao vasto e inovador conjunto de obras de Bach para instrumento melódico — violino, flauta, viola da gamba — com cravo obrigado (≪obligatto≫ em italiano) e em que este instrumento deixa de estar limitado ao então esperado e comum papel de acompanhador, realizando os acordes indicados pelas cifras do baixo continuo, para partilhar a função de solista com o outro instrumento, com o qual dialoga de igual para igual. Apesar de Bach manifestar um grande apreço pela viola da gamba, que incluiu em cerca de 15 obras vocais — cantatas e paixões — compostas ao longo de toda a sua vida, estas três sonatas constituem o culminar da sua escrita para o instrumento e, na
verdade, do repertorio gambistico em geral. A viola da gamba conheceu ao longo do seculo XVI e XVII uma grande voga em toda a Europa enquanto instrumento camerístico, e na transição e primeiras décadas do século XVIII surgiram vários virtuosos do instrumento, sobretudo em Franca e na Alemanha, que compuseram uma extensa literatura, a solo, composta quer por suites ao gosto francês, quer por sonatas ao gosto italianogermanico. No entanto, ao longo de Setecentos foi perdendo popularidade, e apos um quase total desaparecimento, só reencontrou de novo o seu lugar na vida musical já no seculo XX. Sendo um instrumento com características físicas e musicais muito diferentes do violino e do violoncelo — instrumentos com que o publico mais incauto continua a confundir a viola da gamba… — a sua requintada e exigente construção dedicaram-se luthiers muito famosos e considerados no seu tempo pela qualidade da sua produção. Na Inglaterra de finais do seculo XVII — que também conheceu um alargado e entusiástico culto pela viola da gamba — distinguiu-se particularmente o violeiro Barak Norman (1651-1724) que construiu alguns dos instrumentos mais requintados, ainda hoje impossíveis de imitar. Sofia Diniz é um dos poucos interpretes actuais com o privilégio de possuir uma viola da gamba construída por Barak Norman, que fara escutar neste recital Bach.
Sofia Diniz, Viola da Gamba de Barak Norman (século XVII)
Fernando Miguel Jaloto, Cravo
JOHANN SEBASTIAN BACH (1685-1750)
Sonata I em Sol maior, BWV 1027
Adagio
Allegro ma non tanto
Andante
Allegro moderato
Sonata II em Re maior, BWV 1028
[Adagio]
[Allegro]
Andante
Allegro
Sonata III em Sol menor, BWV 1029
Vivace
Adagio
Allegro
Duração aproximada: 45’00”